terça-feira, 20 de junho de 2023

Precipitação – Bergeron / Findeisen


" Pelo processo de Bergeron / Findeisen, percebo que gotas sobrefundidas se evaporem e sublimem sobre cristais de gelo que, com o peso, caem e fundem, originando a precipitação. O que não percebo é o processo que leva as gotas a anexarem-se aos cristais. Sei que está relacionado com a pressão de vapor…" 

Carlos

Exatamente, este processo está relacionado com o valor atual da tensão de vapor e com a diferença entre os valores da tensão de saturação relativamente à fase de água líquida (sobrefundida) e relativamente à fase de gelo:

Tensão de vapor. Tensão de vapor (ou pressão de vapor), designa simplesmente a pressão parcial do vapor de água, isto é, a parte da pressão atmosférica originada pela presença do vapor de água. Quando se dá a evaporação da água, o gás vapor de água daí resultante passa a contribuir para a pressão atmosférica, designando-se essa contribuição por tensão de vapor ou por pressão parcial do vapor de água.

Tensão de saturação. Num determinado volume, o valor atual da tensão de vapor resulta da quantidade de vapor de água aí presente. Por outro lado, a quantidade máxima de vapor de água que pode existir nesse mesmo volume depende da sua temperatura (quanto mais elevada for a temperatura, mais elevada será a quantidade de vapor de água admissível nesse volume). Isto é, para um determinado volume de ar, a uma determinada temperatura, existe um valor atual para a tensão de vapor (resultante da quantidade de vapor de água efetivamente existente) e um valor máximo para essa mesma tensão, valor esse que depende da temperatura. Este valor é designado por tensão de saturação. Se a tensão atual ultrapassar a tensão de saturação, parte do vapor de água encontrar-se-á em excesso, podendo vir a condensar (o processo de mudança de fase depende igualmente de outros fatores, como da existência de núcleos de condensação e de núcleos de congelação).

Humidade relativa. A humidade relativa é aproximadamente igual ao quociente entre a tensão atual de vapor e a tensão de saturação para a temperatura observada tendo um valor máximo de 100%.

Diferença entre as tensões de saturação relativamente ao gelo e à água líquida. A temperatura inferior a 0°C, a tensão de saturação do vapor relativamente à fase líquida é superior à tensão de saturação que se verifica relativamente à fase sólida; isto é, na presença de uma superfície de água líquida e de uma superfície de gelo no mesmo espaço, o vapor de água depositar-se-á, preferencialmente, sobre a superfície de gelo (a tensão de saturação relativamente ao gelo é mais baixa, atingindo-se mais cedo).

Núcleos de congelação e núcleos de condensação. Contudo, para que se dê inicio à congelação da água líquida ou à condensação do vapor de água, é necessária a presença de núcleos de congelação ou de núcleos de condensação, respetivamente. Estes núcleos constituem estruturas físicas de suporte que possibilitam o processo de agregação das moléculas na nova fase (por exemplo: partículas de poeira, partículas de sal, …).  Na ausência destes núcleos, a tensão atual de vapor poderá ser consideravelmente superior à tensão de saturação sem que daí ocorra imediatamente condensação ou congelação. A introdução e difusão deste tipo de núcleos numa nuvem está na base dos processos de inseminação artificial de nuvens, com vista à estimulação da precipitação.

Água sobrefundida (ou sobrearrefecida). A temperatura entre os 0°C e os -40°C negativos,  parte da nuvem é constituída por  gotículas de água sobrefundida, em suspensão (gotículas na fase líquida, a temperatura negativa). A presença desta fase líquida num determinado volume, a temperatura negativa, indica que a tensão de saturação do vapor relativamente à fase líquida já terá sido atingida. Indica também que a tensão de saturação do vapor relativamente à fase sólida já terá sido  igualmente ultrapassada, visto ter um valor inferior. A razão mais plausível para a água não se encontrar já toda congelada prende-se com a ausência de núcleos de congelação.

Crescimento dos cristais de gelo. Se entretanto, algumas dessas gotas sobrefundidas congelarem, ou se uma ou outra gota já congelada cair do topo da nuvem para dentro desta região, uma parte do vapor de água existente depositar-se-á de imediato sobre estes novos cristais de gelo, funcionando os mesmos como núcleos de congelação. A diminuição da quantidade de vapor disponível terá como consequência a diminuição da tensão atual do vapor, ficando abaixo da tensão de saturação relativamente às gotículas na fase líquida (que tem um valor mais elevado).  Ainda assim, a tensão atual do vapor manter-se-á acima da tensão de saturação relativamente à fase sólida já que esta apresenta um valor inferior. Isto é, o afastamento da saturação relativamente à fase líquida levará a que novas gotas da fase líquida se evaporem, disponibilizando mais vapor de água; o qual por sua vez, sublimará sobre os cristais de gelo então formados, já que relativamente a estes, o vapor de água ainda se encontra saturado. À medida que o volume destes cristais de gelo aumenta, mais superfície sólida é disponibilizada, acelerando o processo de sublimação. Estes cristais constituirão neve em grãos, flocos ou cristais, de acordo com a velocidade a que ocorrer a sublimação; esta está relacionada com a temperatura a que vier a ter lugar. O aumento de volume dos cristais de gelo (neve) deverá continuar até que, devido ao excesso de peso, se dará início à precipitação dos cristais mais pesados sobre a forma de precipitação do tipo neve. Caso ocorram temperaturas positivas durante o trajeto descendente, os cristais de gelo fundirão dando origem à precipitação do tipo chuva. Isto significa que a precipitação do tipo chuva resulta de neve que fundiu a altitudes mais elevadas.

Processo de formação da precipitação segundo Bergeron / Findeisen. A temperatura abaixo de 0°C e acima de -40°C, as gotículas de água líquida sobrefundida constituintes das nuvens tendem a evaporar, sublimando em seguida sobre os cristais de gelo existentes. Este processo só ocorre em nuvens que contenham simultaneamente gotículas de água sobrefundida e alguns cristais de gelo. O processo só tem início quando parte da nuvem atinge temperaturas negativas e termina se todas as gotículas se encontrarem na fase sólida. Razão pela qual, a precipitação não ocorre nas nuvens altas  (demasiado frias, apenas constituídas por cristais de gelo), ocorre na maior parte das nuvens médias  (embora a precipitação possa não atingir o solo se vier a evaporar durante o trajeto descendente; ex.: virga – precipitação que se evapora no trajeto descendente não atingindo o solo) e ocorre nas nuvens baixas, apenas após ter sido atingido um determinado desenvolvimento vertical  (quando o topo da nuvem atinge temperaturas suficientemente baixas para se gerarem os primeiros cristais de gelo). Este é o designado modelo de formação da precipitação segundo Bergeron – Findeisen ou das nuvens frias. Existem outros modelos de formação da precipitação a ser desenvolvidos noutro post.


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